Monday, September 11, 2006

Nine Eleven

Agora já são muitas fotos com a Newman Haas ultimamente nesse blog, mas essa não tem jeito – só tem um nine eleven, o de cinco anos atrás. Não a Porsche, a data. Daquelas que marcam tanto, que você pressente que vai contar para os netos, em muitos anos, onde estava. No meu caso, na Alemanha, com a extinta CART, para as rodadas européias, compostas dessa prova em Lausitzring, seguida da etapa inglesa em Rockingham, outro oval. Continue no "Leia Mais Aqui".

Apesar da viagem agradável (autobahn é sempre autobahn, divertido) de Berlim a Lausitz, a cidade mais perto da pista, o tempo estava sempre feio, dava para sentir o ar pesado – ou pelo menos é fácil imaginar isso agora, depois do fato ocorrido. Berlim é uma cidade muito bonita, o imponente Reichstag, o portão de Brandenburg, Check-point Charlie, o Estádio Olímpico, mas é impossível admirá-la sem se pensar nas cenas do nazismo, mesmo que isso não tenha nada a ver com a Alemanha de hoje.
Em suma, o estado de espírito não era exatamente festivo. Tranquilo, mas mais reflexivo que em clima de festa.
Logo na primeira tarde que estávamos na pista, um RP de uma outra equipe veio me contar que um avião de linha havia batido em uma das torres em Nova York. Eu dei uma risada e pedí pela gracinha logo, a piada rápido que tinha mais coisas a fazer, os afazeres de rotina. Mas ele me trouxe até a sua salinha da equipe, ao lado da nossa, que tinha uma televisão ligada, mostrando a CNN e a cena do primeiro avião. A coisa é real, e séria, pensei. Assistí um pouco, e seguí com os deveres. Nos momentos seguintes, todos que encontrava pelo paddock comentavam, ou perguntavam se eu sabia de algo...até que pouco tempo depois, um mecânico me disse que um segundo avião havia batido na outra torre. Eu comentei que “mecas” não eram fáceis, que já estavam fazendo piadas com o que me parecia mais uma catástrofe. Aí, de novo, entendí que ele falava sério e fui procurar uma TV com a CNN. O segundo avião apareceu vindo quase de frente, da direita para a esquerda, por trás do lado que a TV mostrava, das duas torres. A torre da direita, que já havia sido atingida, tinha seus andares mais altos completamente envoltos em fumaça negra. O avião sumiu atrás dela…inconscientemente meus olhos seguiram o curso que ele estaria fazendo através da primeira torre em chamas, da segunda, e antes que eu focasse no céu atrás da torre da esquerda esperando vê-lo, uma bola de fogo laranja “brotou” do prédio. O avião tinha entrado do outro lado, e “empurrado” aquela explosão para fora. Era verdade, um ataque planejado, e executado, em solo americano, Pearl Harbor. E de novo bem-sucedido. Unbe-fu**ing-lievable. E, logo depois, ainda mais surrealismo: o Pentágono, o vôo 93...

A partir daí, todo mundo na pista só pensava nos familiares e amigos nos EUA, pior ainda para os que eram de Nova York. Parecia também que, nos dias que se seguiram, em todo lugar que se estivesse havia uma TV ligada na CNN, com detalhes que iam aparecendo aos poucos. Uma novela global, literalmente, impossível de se tirar os olhos. No dia seguinte, as coisas seguiam confusas, com todo mundo muito (óbviamente) transtornado. Circulavam rumores de que a Embaixada Americana na Alemanha estava advertindo-nos que esse evento da CART era um dos maiores contingentes de americanos fora do país, convenientemente reunidos em uma área razoávelmente pequena...e debatiam até mesmo a realização ou não da corrida, acentuando ainda mais o leve “terror” que naturalmente se aloja em uma situação dessas. Junte-se a isso o fato de que estávamos hospedados em Lausitz, a cidade alemã que foi duramente bombardeada no final da segunda guerra, e traz algumas cicatrizes até hoje, fazendo com que os ânimos se mantivessem, no mínimo, circunspectos.

Quando voltamos para o hotel, fui dar uma corrida (a pé) antes do jantar, por um belo caminho ao lado do rio da cidade, tentando entender o que isso tudo significava, principalmente para uma “tribo” como a nossa, que tem como ambiente natural grandes concentrações de pessoas, e aeroportos/aviões. Passa-se muito tempo do trabalho em locais assim. De um dia para o outro, viramos grupo de risco, alto.

As consequencias daquela declaração de guerra são sentidas ainda hoje, e acho que ainda serão por algumas gerações, seja como for. Os americanos ainda não haviam entendido o recado do ataque ao Cole e das embaixadas na África, e agora de maneira ridículamente repentina chegava a intimação, e o povo azul, branco e vermelho ficou de uma vez um pouco menos ingênuo sobre seu grau de aceitação nas pesquisas mundiais.

Infelizmente, a tecnologia avançou e hoje explosivos podem tomar a forma de papel, líquidos, plásticos. Uma hora vai ficar impossível entrar no avião com pouco mais que sua roupa do corpo, e mais cedo ou mais tarde, um inimigo que vai se matar junto (ou dez) acha um meio. A coisa é complicada, complicadíssima, e o relógio deles anda bem mais devagar que o nosso – eles pensam em gerações que lutam da mesma maneira assassina, tentando vencer pelo atrito e terror, enquanto pensamos apenas em termos de anos, e vitórias em termos de sanções e sucessos puramente econômicos ou culturais que consigamos forçar goela abaixo do resto do mundo não civilizado. Não falamos a mesma língua, mesmo.
São extremistas religiosos, e ninguém ganha nada em argumentos sobre religião com fanáticos, de qualquer grupo. Mas existem verdades irrefutáveis se queremos evoluir como civilização, e uma delas é que existe algo errado, conceitualmente, em qualquer ordem ou mandamento inquebrável de que uma parte da raça humana deve ser sistematicamente negada oportunidades de avanço cultural e espiritual (no caso deles, as mulheres; no caso do nazismo, os não-alemães, os exemplos abundam), o que dizer do conceito que, segundo sua crença, ao se matar em uma tempestade de explosivos e pregos, levando junto a maior quantidade de civís incluindo crianças, etc, você entra em uma fila expressa para o paraíso, e 72 virgens. O caminho do Céu. Esses caras precisam ir passar o carnaval no Brasil, sei lá, relaxar um pouco.
Falando sério, nenhuma matança dessas pode ser justificada, e eu entendo que os EUA não são santos, e já fizeram atrocidades absurdas. Mas estamos falando de uma religião que acredita em valores muito contrários aos meus, que prefiro morar na atualidade, e não na idade média. Igualdade de oportunidades para todos é um valor que tem um outro peso para qualquer um que já trabalhou (ou tentou) e procurou se destacar em um país ou cultura estrangeira. E já foi dito que mais vidas foram levadas precocemente em nome de extremos religiosos do que qualquer outro motivo...Na verdade, o problema é o extremo, e não a religião. Aliás, uma das razões pela qual existe pouquíssimo recrutamento, por parte de grupos terroristas, de jovens insatisfeitos em comunidades islâmicas na América do Norte é justamente que a religião, assim como tantas outras, convive muito bem com o modo de vida americano, criando jovens bem adaptados a sociedade, livres para escolher ou não seu culto, e produtivos. Na Europa, onde o recrutamento em templos é comum, os jovens com as mesmas origens não escondem estarem insatisfeitos com seu lugar (inferior) na sociedade, marginalizados e sem emprego. Campo fértil para futuros fanáticos.

Mas eu fui longe. A corrida em sí, acabou acontecendo mesmo no fim de semana, mas foi uma das mais “pesadas” que já presenciei na vida, terminando com o acidente do Zanardi...que fim de semana. Logo depois, voamos para a Inglaterra, e na semana seguinte de volta aos EUA – em vôos sinistramente vazios, depois de deixar cortadores de unha, canetas, etc no raio X. Quanto mais as coisas mudam, mais elas permanecem as mesmas.

Na foto, momentos antes da largada, a Newman Haas (do carro #6) perfilada com as bandeiras alemã e americana, completa com Cristiano e este que vos escreve...

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1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Veja só o que é a vida: essas etapas antes de acontecerem foram marcadas com muita expectativa, e todos apostavam em seu sucesso. Então aconteceu a tragédia em NY e tudo mudou, pois o público ficou com medo de ir nas corridas, sem falar nos problemas causados pelas chuvas em ambas as etapas. Para completar, teve o acidente do Abacaxi, que só por milagre ficou vivo. A aventura da Cart na Europa morreu de início por conta desses acontecimentos.

9:04 AM  

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